Meu
nome é Ângela sou loura e, por sinal, muito linda olhos azuis, 25 anos de
alegria, tristeza, solidão e agonia.
A
história que vou contar a vocês é real e aconteceu comigo. Podem soltar suas
emoções e chorar porque isso é bonito e faz parte da vida, meus irmãos e irmãs
do mundo todo.
Conheci
Jocrésio numa encruzilhada bem no seio de um cemitério num dia lindo de muita
chuva. Era dia de finados e eu levava flores para a velha Cudores, minha
falecida avó. Eu e Jocrésio nos apaixonamos no ato, ou seja: ele por mim e eu
por ele. Nunca tive preconceitos: ele era gago, manco e com o tempo perdeu um olho, além
de ter um mau hálito da peste. Quando muito nervoso soava e lamentavelmente também
peidava, mas isso é normal. Levei-o para minha casa e o alimentei, pois ele
estava muito faminto. Jocrésio e eu nos casamos e o nosso amor era muito lindo.
Meu cheiro era pedreiro.
Um dia, ele estava no alto de um prédio rebocando quando
levou um tombo e desceu rolando abaixo daquele prédio gigante. Sua coluna foi
pro pau e por azar ele ficou impotente. Mas nosso amor era lindo e ele tinha
mãos fortes e peludas que me faziam um carinho da hora. Meu cheiro passava o
dia todo sentado numa cadeira de rodas e eu dava um duro danado para sustentar
nossa humilde casinha na favela da Rocinha.
Numa noite
de verão bem quente, ele me acariciava quando de repente uma bala perdida
invade nossa casinha e se encontra com uma de suas mãos. Não teve jeito: sua
mão direita foi amputada, mas ele ainda tinha a esquerda e, o nosso amor era
lindo.
Jocrésio
adoeceu de vez depois que perdeu aquela mão. Após sérios exames foi constatado
que tinha diabetes, câncer do pâncreas e aí danou-se tudo. Como se não bastasse
ele ainda ganha uma trombose e suas duas pernas com pés e tudo foram pro pau.
Que estado miserável ficou este homem, meu Deus! Sua boca inchou e todos os
seus dentes caíram; sua outra mão também foi amputada, mas ele ainda tinha
braços, me fazia um carinho da hora com aqueles toquinhos e o nosso amor era
lindo. Por tragédia do destino seus braços também foram amputados e, aí
danou-se de vez mesmo.
Jocrésio
teve três AVC, perdeu outro olho e também a fala, mas ele ainda tinha tórax e o
nosso amor era lindo. Veio o diabo de uma ferida em sua bunda e aquilo não
sarava nem com reza brava; ganhou uma coceira no ânus e eu tinha que ficar
coçando pra ele até que meu cheiro dormisse. Isso era direto. Aquela ferida
foi crescendo, crescendo que se multiplicou de certa forma que não teve outro
jeito: seu ânus também foi amputado juntamente com o seu pênis e aí danou-se de
danar-se de vez mesmo. A ferida se alastrou, comeu o tórax dele, as orelhas e,
as narinas, seu pescoço e meu cheiro estava sumindo. Caíram seus cabelos,
seus olhos cegos e ele ficou sem face, mas seu coração ainda batia tic tac e o
nosso amor era lindo.
Eu não
tenho preconceitos, mas o homem ficou sem nada, gente! Até que um dia, seu
coração parou de bater e ele morreu. Fiz um pedido no necrotério e fui
atendida: deram-me seu coração parado e eu tenho guardado ele até hoje em meu
freezer porque nosso amor ainda assim continua muito, mas muito lindo mesmo.
doutorboacultural.blogspot.com/
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