sábado, 27 de outubro de 2012

O BILHETINHO PREMIADO


Teba era um nordestino porreta, trabalhador, “pau pra toda a obra”. Casado com Tiba com quem tinha oito filhos. Pagava aluguel numa casinha feia num cortiço onde moravam mais umas doze famílias. Só havia um banheiro pra toda essa gente e, isso era um problema sério, sô!
Teba era um excelente borracheiro e chegava a sua casa de segunda a sexta sempre as noitinhas. Tirava seus botinões de borracha e os urubus faziam campo de aviação no telhado de sua casa; pois, é! O sujeito tinha um chulé praga que deixava sua mulher e filhos dopados, sô!
O grande sonho de Teba era ganhar na loteria para tirar sua família da boca da miséria. Tiba era doméstica do próprio lar e, por sinal, muito caprichosa. Deixava sua casa perfumadinha e com os panelões de arroz e feijão prontos para a chegada de Teba, que trazia sempre uma mistura diferente. Tiba e seus oito filhos pulavam alto de tanta alegria. E olha que essa família comia, viu sô!
Tuba era a cadela da família. Feia, magra feito uma cana, ficava em sua casinha no quintal e amarrada. A bichinha era bravinha, sô! Latia a noite toda. Bastava o galo soltar um peido, e pronto. Latia tanto que acordava até as galinhas que costumavam acordar cedo. Que cadelinha chata e mal educada, sô!
Teba jogava todos os dias na loteria na esperança de ganhar, é claro. Todas as noites, após tomar seu banho, ele sentava no sofá úmido, fedido, suado e velho e ficava conferindo suas apostas. Sua esposa Tiba estava cansada de ver tantos bilhetinhos de apostas espalhados pela casa e, protestava para o marido.
- Pare com isso, Teba! Todo tipo de jogo é do diabo! É tudo combinado. Pobre não ganha não.
Teba era fanho e, quando ficava nervoso, era difícil de entendê-lo.
- Fun fala festeira, fulhé! Fun fia feu fô fanha.
Talvez ele quisesse dizer: “Não fala besteira, mulher! Um dia eu vou ganhar”
E Tiba ficava aperreada.
- Vai ganhar nada, filho de uma égua sem patas! Pense na conguinha da Julinha. A bichinha ta indo pra escola só de meias, por causa que nem uma porreta chineleta da fé, ela tem para calçar em seus pés.
Teba não parava de conferir as apostas.
- Fofê fun fabe Fo Fe fala, fulhé. Fun fia fou fanha fa foteria Fe famos fodos ficá ficos.
Talvez ele quisesse dizer: “Você não sabe o que fala mulher. Um dia vou ganhar na loteria e vamos todos ficar ricos”.
E Tiba tava atentada.
- Vai ganhar nada, filho de brinquedo do cão! Pense na cueca de Jozéca. O coitado ta cagando na calça e a trouxa aqui lava...
De repente, opa! Vixi, sô! Pra que segredos? Tem horas na vida que só uns peidos. Teba soltou logo uma peidorreira de primeira categoria de tanta alegria. Soltou até sua cadela. Ele e sua família pulava feito pulga na bunda de gordo. Era alegria demais, sô! Socou a coitada da geladeira velha que pifou na hora; chutou as panelas e mandou seu fogão pro espaço; o sofá ele deu pro vizinho Josafá que só gostava de sentar; de tanta alegria deu uma surra da peste em toda a sua família. Teba ficou louco, sô!
No meio de toda aquela confusão, roupas, alimentos e objetos espalhados pelo chão, epa Jureba! Cadê o abençoado bilhetinho premiado? Teba ficou duplamente nervoso.
- Fo filhete fava faqui. Fonde foi Fe foi farar fele?
Talvez ele quisesse dizer: “O bilhete tava aqui. Onde foi que foi parar ele?”
E Tiba puxava seus próprios cabelos e dizia chorando.
- Eu não sei. Sei não eu. Não sei eu. Eu sei não. Sei eu não.
Teba tava quase tendo um infarto, sô! Arregalou seus olhos gordos e, sua família e mais as dozes do cortiço ficaram em silêncio total. Todos ouviram um som tipo assim: “RESKROSKRASKRASGUE”. Xiii, sô! A cadelinha Tuba brincando há horas com o bilhetinho que virou picadinhos. Teba pegou sua espingarda, deu três tiros pro alto e disse:
- Feu fou fatar fessa fadela.
De certo a cadela Tuba entendeu: “Eu vou matar essa cadela”. Tuba saiu numa correria da peste e Teba foi atrás.
Tiba, calmamente pega pedacinho por pedacinho daquele bilhetinho e cola, pacificamente, enquanto Teba corria atrás de Tuba. Não é que \Tiba conseguiu colar bonitinho aquele bilhetinho, sô? Foi receber o prêmio na caixa econômica e, o gerente lhe diz, com pena.
- Sinto muito, senhora! Não posso lhe pagar é nada por esse bilhete todo colado. A montagem da colagem ficou perfeita, mas, peraí! To vendo uns números aqui que não são os premiados. Este bilhete não é o premiado, senhora.
Ela ficou é muito feliz com essa notícia, sô! Voltou pra casa, deu um abraço em Teba que não parava de chorar e ela tenta consolá-lo.
- Marido lindo, não chore homem.
E Teba responde.
- Feu fão five foragem fe fatar Fuda. Fela fesma fulou fo fio. Fadinha! Ferá fe felá forreu fou fá fida?
Talvez ele quisesse dizer: “Eu não tive coragem de matar Tuba. Ela mesma pulou no rio. Tadinha! Será que ela morreu ou ta viva?”
E Tiba estava alegre demais.
- Deixa essa peste de cadela pra lá, homem! To pra dizer a maior: aquele bilhetinho que Tuba picou todos com os dentes não era o premiado. Fui até a caixa econômica e...
Teba soltou um peido emocionado.
- Fulhé! Famos frocurar fireito fesse filhete.
E reviram toda a casinha e nada. Procuraram por tudo, menos no bolso da camisa de Teba. Ele mesmo foi quem achou.
- Fa faqui, Fachei fo filhetinho fremiado.
Talvez ele quisesse dizer: “Ta aqui. Achei o bilhetinho premiado.
Que final feliz teve Teba e sua família, sô! O cabra, inteligentemente, ganhou sozinho uma bolada acumulada da mega sena e, não queria ir muito longe não. Comprou o cortiço, fez mais uns banheiros, reformou sua casinha e continua lá, sô!
E para alegria das crianças quem vinha lá, abanando o rabinho? Tuba. E pereba da muleka, sô!

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