Sô! Um bolinho doce é bom demais, não é? Até as baratinhas
gostam. Agora, uma coisa eu vou ter que dizer: Tem que ter mãos combinadas com
o tal do “segredinho”, sô! A receita pode ser porreta, mas, se o cabra ou a
cabra metidos a confeiteiros não acrescentar o tal do “segredinho”, o bolo vira
bola e aí, lasca-se tudo.
Lúcia era uma adolescente esperta. Gostava de ler desde gibi
até Jorge Amado. Tinha olhos de coruja, não piscava pra não perder o lance. A
muleka pulava da cama, corria pro banheiro com um gibizinho ou uma revistinha
e, vixi, sô! Arrumava até encrenca com seus irmãos pela demora no banheiro. Era
um silêncio quase que total. Quer dizer, só se ouvia um “tlesc”. Era quando ela
virava a folha do gibizinho ou da revistinha.
No tempo de Lúcia não tinha internet não, sô! Sua distração e
entretenimento, além de ler, era olhar pro Nenê, seu irmãozinho que mais
parecia uma besta. Ela ria do Nenê que dava gosto de ver, sô! De certo pensava:
“Será que essa besta vai dar certo na vida, um dia?”
Lúcia era um mistério. Alguns achavam que ela, no futuro, ia
ser uma escritora, talvez uma professora, outras uma economista, pois, ela
gostava de contar um dinheirinho como ninguém, sô! Foi até tesoureira de banco,
sô! Seus pais, irmãos e amigos ficavam boquiabertos vendo a agilidade de seus
dedos contando dinheiro. Só se ouvia “tlesc, tlesc, tlesc e tlesc”.
A muleka cresceu e gostava de inventar coisas. Mais um pouco
e Ana Maria Braga não seria tão famosa como é hoje, por causa de Lúcia. A
danada fazia uma maionese que só pela misericórdia dos ovos, sô! Com certeza,
ela botava um segredinho ali porque não sobrava nem um milímetro pra matar a
fome da mosquinha que vinha voando de longe, mas, chegava sempre atrasada. O
que, sô? A família de Lúcia era grande demais. O que esse tal de Nenê levou de
tapas na cabeça para aprender a ter modos, não foi brincadeira. Ele lambia até
o motorzinho do liquidificador. Não se sabe até hoje como é que ele conseguia
fazer isso.
Um dia, Lúcia apareceu com uma idéia e chamou seu irmãozinho
Nenê para lhe contar, porém, pediu segredo. Ia rolar um bolo ali, sô, diferente
de todos. O problema maior era a vizinha Nena e sua renca de filhos. Nena e sua
filharada tinham um faro feito cão quando a cadela ta no cio viu? E eles
costumavam invadir a casa e, ninguém sabia o que é privacidade não, sô!
Os ingredientes saiam caro, sô! Milagrosamente, catando
moedinhas daqui e dali, pronto: tudo indicava que surgiria um bolo nas próximas
horas. Então, Nenê ia com a listinha no mercadinho do bairro do limão, onde
moravam, com uma restrição de Lúcia: “Vigie se Nena não está te seguindo”. Nenê
tinha umas perninhas fininhas e sabe-se lá se voava ou não. Ninguém o notava na
multidão. Comprava tudo direitinho e, não é que ainda sobravam umas moedas para
o tal pingo de leite? Até hoje, sô! O tal do Nenê adora esse pingo de leite que
só a peste.
Quando Lúcia tava preparando a massa do bolo, quem vinha
cheirando o ar? Ela mesma: Nena. E as crianças vinham atrás. Ainda bem que
Lúcia e sua família moravam na última casa de um escadão, pois, assim dava
tempo dela esconder o que estava fazendo. Que visita inconveniente, sô! Nena
atacava o café, seus filhinhos pedindo doce e, não teve jeito. Enquanto não
provaram do bolo de prestígio de Lúcia não saíram dali. E comeram bem, sô! Mas,
houve muitas outras boladas e, dessa vez, longe de Nena e suas crianças
famintas.
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