domingo, 1 de setembro de 2013

SORTE E AZAR



Sorte era uma mulher muito linda. Sua beleza interior e exterior encantava a todos. Excepcionalmente inteligente, Sorte sempre estava ao lado de grandes celebridades. Que mulher formosa, sensual, charmosa e elegante! Sorte só tinha virtudes. Sábios do mundo inteiro, afirmam até os dias de hoje que esta grande e exuberante mulher não tinha defeitos.



Azar era um homem caído em todos os sentidos. Lamentavelmente, não teve sorte na vida. No que foi parido por sua mãe Pilory já engoliu água do parto e, presumo que esta água deve ser sujinha. O pobre Azar nasceu na seca do sertão nordestino e, passou toda a sua infância levando tapas na cabeça de seu padrastro Epiderme, um velho tão ruim feito o caçula de Satanás, o Diabo, o maioral dos quintos dos infernos.
Fazia oito meses que não chovia no sertão e, bem no dia que Azar completou doze anos, sua mãe Pilory deu uma festa pro moleque e choveu largado. Pensem numa chuva. Molhou até o bolo de fubá e a buchada de bode.
Azar sonhava em ser um engenheiro um dia, porém, sua mãe e seu padrasto não  o deixaram estudar. Azar tinha que trabalhar na roça e fim de papo. Quando completou vinte e um anos deu uma surra de pau em seu velho padrasto e fugiu daquele sertão indo para São Paulo. Chegou à grande cidade apenas com umas moedinhas no bolso que mal dava para tomar um cafezinho. Conseguiu um trabalho de gari e, no primeiro mês, dormia nos bancos das praças, depois alugou um quartinho com o dinheirinho que juntou e, parecia que as coisas estavam dando certo para ele na vida.
Azar sentia uma necessidade enorme de amar e de ser amado também, é claro, porém, o coitado era tão feio que assustava as mocinhas de boa família simplesmente pelo fato dele existir. Ia pros bailões e, lá, ficava chupando os dedos. Ficava na saudade. Pois é, parece que ser feio não leva vantagem nenhuma na vida.
Sucedeu que um dia, Azar ganhou de um velho gagá e louco uma chácara em Mogi das Cruzes, interior de São Paulo. Sim, aquele velho disse para Azar que já estava para morrer e não tinha com quem deixar aquela chácara e, ficou com pena de vê-lo comer pão com cebola bem de frente a uma churrascaria que freqüentava o velho e outros bacanas da grana. O velho diz para Azar:
- Filho de Deus, confesso que nunca vi antes, em toda a minha vida um ser tão feio assim como você. Mas, peraí! Nem tudo está perdido. Seus dentes são bonitos e, isso não tem nada haver. Vou lhe dar casa e comida pro resto da vida, porque estarei morrendo na próxima semana. É pegar ou largar.
Azar ficou tão surpreso e tão emocionado que se cagou todo. Coitado. Foi conhecer a chácara e adorou. Parece que aquele velho louco era profeta mesmo. Morreu  deixando uma escritura de sua chácara para Azar. O infeliz não sabia ler, mas, parece que aquele papel tinha certo valor.
No passar dos dias, semanas e meses, Azar foi enriquecendo. Tudo o que plantava dava naquela sagrada terra e, é claro: o dinheiro só tendia a crescer. Ficou metido feito um olho de peixe no pé judiado de Maria. Só que o cabra não tinha sorte no amor não.
Sucedeu que um dia, estaciona bem de frente a sua chácara uma limusine bege como um beijo e, pensem numa beldade que saiu de dentro daquela limusine. Sim, era ela mesma: Sorte veio visitar Azar. No que o miserável bateu os olhos naquela encantadora mulher, seu coração pulou e, automaticamente, uns peidos foram libertos da prisão de seu ventre. Que alívio!
Sorte com tamanha simpatia e educação, pergunta para Azar:
- Posso entrar?
E Azar beija os pés daquela dama linda feita uma das jóias caríssimas de Elizabeth Taylor e diz:
- Este chão é teu princesa.
Parece que as palavras têm mesmo poder, não é? Sorte tira de sua bolsinha de couro de jacaré chinês, uns papéis e diz para Azar:
- Este chão realmente é meu. Meu pai era um velho gagá e louco, mas, não tão louco assim porque me deixou a escritura legítima, assinada em cartório e tudo dessa chácara.
Vichi! O que é bom parece durar pouco, gente! Azar não sabia nem para que lado olhar. Soltou logo uma rajada de peidos multiplicativos deixando Sorte preocupada.
- O senhor está sentindo-se mal?
E Azar estava muito mais do que mal: estava péssimo. Suava frio, tremia feito Amado Batista (o cantor) diante da princesa e, Sorte fica muito preocupada.
- Senhor, calma!
Azar se rola no chão, nessas alturas já estava todo cagado e, chora feito um bebê etíope querendo teta e leite da mamãe preta. Sorte tenta acalmá-lo sussurrando em seus ouvidos:


- Eu te amo, bobinho. Sempre te amei. Em vidas passadas fui Lady Lourdes. É claro que você não vai se lembrar. Fui a caçula do velho Nilo. Amamos-nos no ato dos olhares e, confesso: você me completou em todos os sentidos. Por incrível parecer, você se reencarnou e parece que não mudou nada. Parece ser o mesmo homem daquela vida passada. Sou uma das mulheres mais ricas do mundo e quero compartilhar com você tudo o que eu tenho, inclusive o meu amor. Eu te amo e sempre vou te amar e não importa em quantas vidas ainda iremos viver, meu amor. Quero me perder entre estes teus dentes lindos. Morda-me, me ame e me beije, amor da minha vida.
Como a vida surpreende a todos, não é? Nem nessa hora, o pobre do Azar deu sorte. Depois de sentir aquelas mãos suaves e delicadas em seu tórax e de ouvir tal declaração daquela voz suave e tão sensual de Sorte não resistiu: teve um ataque fulminante e morreu. Pois é, Azar que em vida passada foi Parido Aparecido, realmente, não teve sorte nesta vida. Fazer o que? Deu azar.


doutorboacultural.blogspot.com/

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