Finalmente chegou o dia tão esperado por muitos habitantes da
terra. O dia dos justos e fiéis, daqueles que tiveram vergonha na cara de não
se juntarem com os lacraias, com a imundície implacável das bactérias humanas;
daqueles que preferiram levar uma vida tranquila, pacífica do que uma vida
desgraçada, sórdida, marcada e manchada pelo lamaçal do pecado; daqueles que
não se misturaram com os vândalos e se livraram dos escândalos; daqueles que
dividiram o pão com seus irmãos em comunhão e se absteram da prostituição, da
corrupção da carne podre que fora lançada no lago de fogo e enxofre. Eis aí os
vencedores, senhoras e senhores. Valeu a pena esperar por esse dia. Ficaram de
fora todos aqueles que amam e cometem a mentira; os sem vergonhas, pedófilos e
toda a espécie de tarados que deveriam ser linchados desde nenéns para
aprenderem a serem homens e viver pacificamente em ordem. Olhem só quantos
velhinhos barbados e tarados. Será que a vida não ensinou para essas fezes
carnais que é só o amor que satisfaz? Olhem só que pouca vergonha das velhinhas
e também das menininhas. Estão todas na fila do mundo moderno sem saberem que está
indo direto para o inferno. Acabaram-se a agonia das Marias (e de outras
também, é claro), a tristeza das Teresas; o pranto dos Fernandos, os gritos dos
Vinícius, o bem bolado dos Leonardos, a astúcia das Lúcias, as risadinhas das
Aninhas, a fofoca das Auroras e esse tal de ora que melhora. Chega de palhaçada
no reino de Giré. Entrem todos sem frescura e provem do bolo que é de uva.
Sucedeu que, na fila dos fiéis para a entrada nos céus havia
uma bicha, por sinal, muito bonita e, São Pedro, o porteiro, barra a sua
entrada.
- Pode parar, mocinha. Aqui no céu não tem vaga pra você,
não.
Nisso, um sujeito magrelão, de paletó e gravata, que já havia
entrada no céu dá uma olhadinha para trás e tira um sarrinho assim diabólico,
porém, discreto e, aquela bicha vai à loucura.
- Pode parar digo eu, Mona! O senhor deixou aquele linguição
de bigode entrar, por quê? Aquilo ali, lá na terra dava mais que chuchu na
serra, só que não era assumido. Olha só pra cara do sem vergonha, Mona!
O sujeito tenta se justificar.
- Mas fiz muitas caridades, senhor. Inclusive tirei muitos
homens das ruas, os levei para meu sítio e os tratei com muito amor e carinho
e, falei da palavra.
São Pedro olha para todos os lados iguais do céu e diz para
aquela bicha.
- Pode entrar, mas, veja bem: pode parar, hein!
E assim, São Pedro, com aquele jeitinho brasileiro vai
abrindo exceção para a multidão. Os anjos não gostaram nada disso porque o céu
estava virando uma zorra e foram se queixar com Deus, o dono do céu e, isto
inclui a lua.
- Senhor Giré, este povo que chegou aí está fazendo do céu um
inferno. Ninguém quer saber de ouvir melodias angelicais de nossas harpas. Isto
está nos deixando com muita mágoa.
Deus, o sábio dos sábios tenta acalmar os anjos.
- Meus filhos são gente boa e uma hora eles enjoam. Entrem na
festa deles e libertem-se dessas amarras. Soltem suas francas, potrancas. E, depois
outra: estou ouvindo esses hinos angelicais de harpas há milênios. Podem parar!
Uma hora isso tinha que mudar, meu Deus!
E os céus vira num forró bodó da peste silvestre. Até o
Diabo, os demônios e muita gente, mandaram o inferno pros quintos e caíram na
alegria da folia. Como o coração de Deus é grande, especificadamente do tamanho
gigante, perdoou a todos. Foi aí que muitos fiéis protestaram.
- Se soubéssemos que prostituindo, comendo goiabas bichadas
iríamos também entrar aqui, jamais perderíamos nosso tempo com esse papo de
louvor. Que horror, senhor!
- Pois é, de que nos adiantaram ter tanta fé? Passamos nossas
vidas lá na terra, procurando ser certas; virgem feita Maria, ao passo que
essas outras aí curtiram do bom e do melhor e estão no mesmo lugar que nós.
Deus, com total delicadeza, da uma porrada numa nuvem e diz:
- Amados, já facilitei meus dez mandamentos para vocês quando
resumi em dois e, mesmo assim nenhum de vocês foi capaz de cumprir. Para me
amar acima de todas as coisas e a seus próximos como a vós mesmos é preciso ter
fibra. Sei que todos vocês, bons e maus são porras
loucas, mas, não tem jeito: eu amo vocês demais. No meu reino não tem lugar
para racistas e preconceituosos. Tudo isso são coisas de terráqueos. Olhem só os
verdinhos chegando aí com Elis Regina: são seus irmãozinhos marcianos. Vamos
todos dançar porras loucas. Só quero
alegria para minha gigante família.
E assim, todos foram felizes para sempre e isto, também, me
inclui.
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