domingo, 14 de abril de 2013

OLHOS NOS OLHOS


Chico era um cara tranquilo, mulherengo pra caramba, aventureiro que só a peste. Magrelão alto gostava de tomar umas pinguinhas no boteco com os amigos sempre nos finais de semana. Tocava um violão que fazia chorar a madeira. Morava só numa casa bastante grande e, em troca de sua casa sempre bem arrumada, ele dava umas gorjetas para a velha Amélia que trabalhava para ele com prazer.


Chico com seus quarenta anos aparentava ter menos, queria arrumar uma companheira fixa para parar de galinhar. Foi para um bailão e ficou encantado com uma morena tão linda feita uma pantera. Dançou todas e mais uma com a moça de nome Bethânia e lotou sua mesa de cervejas e porções. Na hora de pagar a conta, danou-se. Esqueceu sua carteira em casa. Bethânia, muito gentil, emprestou dinheiro pra ele e boa. Foram pra casa de Chico. Amaram-se feito dois passarinhos naquela noite e Chico esqueceu até mesmo de pagar o dinheiro que devia a ela. Fez uma proposta:
- Queres morar comigo aqui para sempre, meu doce de goiaba?
Bethânia sorridente responde:
- Só se for agora, meu caldo de mocotó apimentado.
E Chico e Bethânia passaram a morar juntos naquela grande casa. Chico dispensou a velha Amélia:
- Não preciso mais de seus serviços, vovó. Adeus e boa sorte no seu final de vida.
O que?! Bethânia agora era quem comandava o lar. Deixava tudo arrumadinho, limpinho e cheirosinho para a chegada de Chico sempre as madrugadas. Vez! Parecia que o amor estava esfriando, sô! Pela cara do safado, ele estava festando com outras mulheres.
Bethânia que tinha as mãos tão lindas, suaves, agora já estava cheias de calos. Ela lavava até as meias e as cuecas do sem vergonha. Não tinha tempo sequer de sentar no vaso sanitário e ler versículos da Bíblia, pois, seu lema era trabalhar.
Bethânia que tinha a pele tão suave e macia, agora estava ficando sebosa, enrugada. Chico ficou uma semana fora, dando um perdido legal na pobre Bethânia. Apareceu num domingo pela manhã com cara de cachorro sem dono.
- Oi meu amor, tudo bem?
Bethânia estava brava.
- Podia ao menos ter ligado para mim, não é?
- Pois é, esqueci desse detalhe. Estava na casa do meu guri.
Chico foi tomar um banho e Bethânia foi conferir o que ele tinha no bolso da calça pesada de tanta sujeira. Vez, sô! Danou. Bilhetinhos diversos de mulheres apaixonadas. Bethânia chorou feita uma cabra nordestina no sertão da seca, da lama e do pau. Olhou-se no espelho e disse pra si mesma:
- Estou ficando velha e feia. Chico não me quer mais. Socorro mamãe Canô! Não posso perder este homem.
Chico com cara de leite pasteurizado lhe diz:
- Seja feliz e passe bem. Adeus.
Chico foi embora de mala e cuia deixando Bethânia na saudade. Na primeira semana ela chora feita uma besta, depois ela se toca e diz pra si mesma, olhando-se no espelho:
- Chega de chorar, sua anta! Daqui pra frente tudo vai ser diferente. Vou ter que aprender a ser gente. Ainda tenho o Roberto e ele está no portão.


Roberto era um grande amigo e também admirador de Bethânia. Amava ela demais, porém, respeitava seu amor por Chico. Bethânia foi sincera com ele:
- Chega de detalhes, desabafo e pare de olhar pros botões da minha blusa, Roberto. Tome seu café da manhã, vá embora e deixe em paz essa fera ferida.
Roberto foi embora procurar, quem, sabe, um amor sem limites.
Bethânia tinha um bom dinheiro na poupança que deixou seu falecido pai de herança. A tigreira passou a freqüentar salão de beleza, casas de massagem e só andava agora no salto alto. Contratou os serviços domésticos da velha Amélia e, agora era só alegria. O amor é lindo demais, Caetano! Até quem não ama sabe disso. Bethânia estava remoçando e, quando Chico a via ficava com cara de pivete desejando chupar um picolé. Ainda assim, depois do fora que Bethânia levou de Chico continuava amando-a com todas as letras de uma das mais belas canções do mundo.
Olhos Nos Olhos
Quando você me deixou, meu bem,
Me disse pra ser feliz e passar bem.
Quis morrer de ciúme, quase enlouqueci,
Mas depois, como era de costume, obedeci.
Quando você me quiser rever
Já vai me encontrar refeita, pode crer.
Olhos nos olhos,
Quero ver o que você faz
Ao sentir que sem você eu passo bem demais
E que venho até remoçando,
Me pego cantando, sem mais, nem por quê.
Tantas águas rolaram,
Quantos homens me amaram
Bem mais e melhor que você.
Quando talvez precisar de mim,
Cê sabe que a casa é sempre sua, venha sim.
Olhos nos olhos,
Quero ver o que você diz.
Quero ver como suporta me ver tão feliz.


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